"Lawfare" e o Uso do Direito como Instrumento de Guerra

Abstract

O Reino Unido convenceu uma seguradora a retirar a proteção de um navio russo que se dirigia à Síria para não precisar abatê-lo usando a força. Os Talibã fizeram a OTAN reduzir sua eficácia em combate ao posicionarem suas instalações próximas a hospitais e escolas. Para designar tais condutas, o termo lawfare expressa a utilização do direito como instrumento para a obtenção de uma vantagem estratégica de cunho militar. Contudo, a incipiente literatura sobre o tema e a ausência de métodos e critérios para sistematizar tal uso de mecanismos jurídicos, permite o emprego do lawfare de forma propositadamente vaga e flexível, a fim de facilitar a legitimação de hostilidades perante as instituições nacionais, internacionais e à opinião pública, o que gera reflexos na segurança internacional. O objetivo geral deste trabalho é investigar a relação entre o direito e os conflitos armados contemporâneos no que concerne à prática do lawfare, analisando suas características para extrair e sintetizar os fundamentos teóricos do fenômeno. Como objetivo específico, pretende-se investigar a possibilidade de se criar um modelo de análise e avaliação da prática do lawfare, que auxilie na distinção entre ela e a aplicação regular de mecanismos jurídicos. O lawfare consiste num fenômeno estratégico com bases jurídicas e, por tal razão, exige um estudo interdisciplinar entre a literatura jurídica e a estratégica para evidenciar os fundamentos teóricos do conceito que poderiam ser utilizados para a elaboração de um modelo de análise. Nesse sentido, a metodologia a ser utilizada consistirá numa pesquisa exploratória, qualitativa, segundo o método hipotético-dedutivo, que empregará como procedimentos a revisão de literatura, a pesquisa bibliográfica e estudo de casos. Como resultado, verificamos que o lawfare representa um desvio de finalidade da aplicação do direito para fins estratégicos e, por conseguinte, revela-se como uma prática nociva à ordem jurídica internacional, distinguindo-se da aplicação regular do direito nesse ponto. A partir da análise dos casos do Brasil e EUA, Rússia e Ucrânia e China e o Mar do Sul da China, o modelo proposto se mostra útil para avaliar situações concretas e contribui para distinguir entre o uso regular dos mecanismos jurídicos e a prática de lawfare.

The UK persuaded an insurance company to withdraw protection from a Russian ship heading for Syria so that it wouldn't have to shoot it down using force. The Taliban made NATO reduce its combat effectiveness by positioning their facilities near hospitals and schools. To designate such conduct, the term lawfare describes the use of law as an instrument to obtain a strategic military advantage. However, the incipient literature on the subject and the absence of methods and criteria to systematize this use of legal mechanisms, allows lawfare to be used in a purposely vague and flexible way, in order to facilitate the legitimization of hostilities before national and international institutions and public opinion, which has repercussions on international security. The general objective of this work is to investigate the relationship between law and contemporary armed conflicts with regard to the practice of lawfare, analyzing its characteristics in order to extract and synthesize the theoretical foundations of the phenomenon. The specific objective is to investigate the possibility of creating a model for analysis and evaluation of the practice of lawfare, to help distinguish it from the regular application of legal mechanisms. Lawfare is a strategic phenomenon with legal grounds and, for this reason, requires an interdisciplinary study between legal and strategic literature in order to highlight the theoretical foundations of the concept that could be used to develop an analysis model. In this sense, the methodology to be used will consist of exploratory, qualitative research, using the hypothetical-deductive method, which will employ literature review, bibliographic research and case studies as procedures. As a result, we found that lawfare represents a deviation from the purpose of applying the law for strategic ends and, therefore, reveals itself as a practice harmful to the international legal order, distinguishing itself from the regular application of the law in this respect. Based on an analysis of the cases of Brazil and the USA, Russia and Ukraine and China and the South China Sea, the proposed model proves useful for evaluating specific situations and helps to distinguish between the regular use of legal mechanisms and the practice of lawfare.