Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa - Juízo de Família e Menores - O direito ao reconhecimento da origem genética e familiar

Abstract

No Direito da Filiação, distingue-se tradicionalmente entre duas modalidades: o estabelecimento da maternidade e o estabelecimento da paternidade, sendo cada uma analisada de forma autónoma. A primeira inclui o reconhecimento voluntário (declaração de maternidade) e o reconhecimento judicial (ação de investigação da maternidade). Já a segunda abrange a presunção de paternidade, o reconhecimento voluntário da paternidade (perfilhação) e o reconhecimento judicial (ação de investigação da paternidade). A ação de investigação da paternidade constitui o instrumento jurídico destinado a estabelecer a filiação paterna de um filho em relação ao seu progenitor biológico, procurando harmonizar a verdade jurídica com a verdade biológica. Partindo do princípio de que todos os indivíduos têm o direito de conhecer a sua origem genética, a ordem jurídica deve garantir a correspondência entre a filiação biológica e a filiação jurídica, sem impor prazos limitativos para a propositura destas ações. A presente dissertação propõe-se analisar a controvérsia em torno da (in)constitucionalidade dos prazos de investigação da paternidade. O n.º 1 do artigo 1817.º do Código Civil, ao fixar um prazo de caducidade para a ação de investigação da maternidade, aplicável igualmente à paternidade nos termos do artigo 1873.º, estabelece que o investigante dispõe atualmente de um prazo de dez anos após atingir a maioridade ou a emancipação para intentar a referida ação. Apesar da extensão desse prazo – anteriormente fixado em apenas dois anos – mantém-se a discussão sobre a tempestividade do direito de investigar a paternidade e sobre se essa limitação restringe o direito fundamental do investigante a conhecer as suas origens genéticas. Reconhece-se que a investigação da filiação pode colidir com certos direitos constitucionais do investigado, como o direito à reserva da intimidade da vida privada e familiar e o direito ao desenvolvimento da personalidade. No entanto, importa analisar se, quando confrontados os direitos e interesses de um filho com os do pretenso pai, é possível harmonizá-los ou se, pelo contrário, os direitos do investigante devem prevalecer, tendo em vista a sua maior relevância valorativa. Neste contexto, com o objetivo de avaliar a (in)constitucionalidade do prazo de caducidade estabelecido para a investigação da filiação, este estudo visa analisar a evolução legislativa e jurisprudencial neste domínio, com especial atenção aos interesses que têm orientado as posições das partes envolvidas no conflito.

In filiation law, a distinction is traditionally made between two modalities: the establishment of maternity and the establishment of paternity, each of which is analyzed independently. The first includes voluntary recognition (declaration of maternity) and judicial recognition (action to investigate maternity). The second covers the presumption of paternity, voluntary acknowledgment of paternity (siblinghood) and judicial acknowledgment (action to investigate paternity). The paternity investigation action is the legal instrument designed to establish the paternal filiation of a child in relation to their biological parent, seeking to harmonize the legal truth with the biological truth. Based on the principle that all individuals have the right to know their genetic origin, the legal system must guarantee the correspondence between biological filiation and legal filiation, without imposing time limits for bringing these actions. The purpose of this dissertation is to analyze the controversy surrounding the (in)constitutionality of the time limits for investigating paternity. Article 1817(1) of the Civil Code, by setting a limitation period for the action to investigate maternity, which also applies to paternity under the terms of Article 1873, establishes that the investigating party currently has a period of ten years after reaching the age of majority or emancipation to bring such an action. Despite the extension of this time limit - previously set at just two years - there is still discussion about the timeliness of the right to investigate paternity and whether this limitation restricts the investigator's fundamental right to know their genetic origins. It is acknowledged that the investigation of parentage can clash with certain constitutional rights of the person being investigated, such as the right to privacy of private and family life and the right to the development of personality. However, it is important to analyze whether, when the rights and interests of a child are confronted with those of the alleged father, it is possible to harmonize them or whether, on the contrary, the rights of the investigating party should prevail, given their greater value relevance. In this context, with the aim of assessing the (in)constitutionality of the limitation period established for the investigation of filiation, this study aims to analyze the legislative and jurisprudential developments in this area, with special attention to the interests that have guided the positions of the parties involved in the conflict.