Contributos para uma abordagem antidiscriminatória do Direito Penal português: insuficiências na incriminação de actos de discriminação

Abstract

Vivemos num contexto social em que o aumento da conscientização sobre o impacto negativo da discriminação estrutural coexiste com a incapacidade das instituições de erradicar os actos discriminatórios. Face a este contexto, a discriminação continua a prejudicar indivíduos de grupos socialmente subordinados, pondo em risco um projecto constitucional de igual dignidade, igual cidadania e igualdade em direitos. A não discriminação, enquanto corolário do Princípio da Igualdade que resulta da Constituição da República Portuguesa, pode ser objecto de soluções penais em Portugal. Face a essa possibilidade de intervenção do Direito Penal relativamente a condutas discriminatórias, a presente dissertação visa estudar as soluções penais antidiscriminação com vigência em Portugal e a sua insuficiência para fazer face ao fenómeno da discriminação. Para tal, fez-se um levantamento das normas do Código Penal português que incriminam actos discriminatórios, tendo sido analisado o seu texto e a sua aplicação pelos tribunais. Com base nesta análise, foram identificadas, especificamente para cada norma, várias falhas que se podem traduzir numa menor protecção das vítimas de discriminação. De um ponto de vista sistemático, concluiu-se que o atual quadro normativo apresenta insuficiências e desequilíbrios na incriminação de actos discriminatórios, incriminando de forma mais ampla determinadas formas de discriminação em detrimento de outras, sem que para tal exista explicação plausível. As conclusões apresentadas sugerem ainda a necessidade de repensar as soluções antidiscriminação oferecidas pelo Direito Penal português, sendo que essa reflexão deve ser efectuada à luz dos princípios constitucionais, do Direito Penal Português, mas também dos contributos da teoria feminista e antidiscriminação.

We live in a social context where the increase in awareness about the negative impact of structural discrimination coexists with the inability of institutions to eradicate discriminatory acts. In this context, discrimination continues to harm individuals from socially subordinated groups, endangering a constitutional project of equal dignity, equal citizenship, and equality in rights. Non-discrimination, as a corollary of the Principle of Equality resulting from the Constitution of the Portuguese Republic, can be subject to penal solutions in Portugal. Given the possibility of intervention by Criminal Law concerning discriminatory conduct, this dissertation aims to study the anti-discrimination penal solutions in force in Portugal and their insufficiency in addressing the phenomenon of discrimination. For this purpose, the provisions of the Portuguese Penal Code that criminalize discriminatory acts were surveyed, and their text and application by the courts were analyzed. Based on this analysis, several flaws were identified for each specific provision, which may result in less protection for discrimination victims. From a systematic point of view, it was concluded that the current normative framework presents insufficiencies and imbalances in the criminalization of discriminatory acts, broadly incriminating certain forms of discrimination to the detriment of others, without any plausible explanation. The conclusions presented also suggest the need to rethink the anti-discrimination solutions offered by Portuguese Criminal Law, considering this reflection should be carried out in light of constitutional principles, Portuguese Criminal Law, as well as the contributions of feminist and anti-discrimination theory.