Fuga e Felicidade no pensamento de Pascal

Abstract

Existe na estrutura da vida humana um certo desencontro entre a realidade e a forma como vivemos. Isto é, parece que vivemos numa espécie de alheamento da realidade, sem a capacidade de olhar a realidade de frente, tal como é. Esta situação é mais obvia nos momentos de dor, em que, de alguma forma, procuramos fazer coisas que nos impeçam de pensar nelas. No entanto, num olhar mais atento, percebemos que este fenómeno abrange mais do que os momentos de dor, abrange toda a nossa vivência. O nosso ponto de vista tem uma natureza centrífuga, i.e., de “partir para outra”. Vivemos, continuamente, a fugir do momento em que vivemos, a desver a realidade: à mínima distração mudamos o nosso foco, nunca vivemos satisfeitos com o que temos, não conseguimos encontrar repouso e, quando o encontramos, não queremos ficar nesse estado– queremos “partir para outra”. Por detrás de tudo isto está uma incapacidade de olhar a realidade, de a compreender e de a aceitar. Nas palavras de Pascal: “O homem é visivelmente feito para pensar. (…). Ora a ordem do pensamento é começar por si, pelo seu autor e pelo seu fim. Ora em que pensa o mundo? (…) em dançar, em tocar alaúde, (…), em tornar-se rei, sem pensar no que é ser rei e no que é ser homem."