Deuses esquecidos: Entre o outrora e o agora

Abstract

Este documento descreve o desenvolvimento do filme “Deuses Esquecidos” e tem por principal cenário os sítios de arte rupestre do Vale do Côa. O argumento, seguindo a sugestão simbólica de John Steinbeck no romance “A um Deus Desconhecido”, propõe uma renovação do valor de culto do Vale do Côa através da sobreposição de imagens e significados. Esta renovação não é só feita dentro do filme: o próprio objecto fílmico pode ser visto como uma gravura ou, pelo menos, como sombra efémera que percorre as linhas sulcadas pelo homem pré-histórico. O filme foi realizado ao abrigo de um protocolo firmado entre a Fundação Côa Parque e a Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa. O filme remete para várias dimensões conceptuais. Exploram-se primeiramente as relações de proximidade entre o dispositivo cinematográfico e a arte rupestre, no que diz respeito aos seus aspectos técnicos e formas de apresentação, e o que isso implica na relação que constroem com o espectador. São também explorados, no contexto de mecanismos de projecção, de si mesmo e do outro, questões relacionadas com duplos, sombras, simulacros e estátuas, sob a asa dos mitos originários da pintura e escultura avançados por Plínio, o Velho, e Ficino. Outras questões relevantes dizem respeito à relação anacrónica do homem com as imagens do passado, - cujo fosso temporal se alarga no caso da arte rupestre - e na capacidade da imagem ser projectada para o presente através da sobreposição de significados, ao uso programático da música, “leitmotives”, à escolha da polifonia feminina a capella e relações propostas entre a voz, o corpo e a alma. Neste documento estão também incluídos a metodologia e materiais elaborados para a realização do projecto – guião, storyboard, descrição da rodagem e das gravações musicais. Por fim, apresenta-se um mapa visual, onde se propõe relações entre o presente projecto e produção artística, cinematográfica e, residualmente, literária de autores de referência, acompanhado de alguns comentários.

This document describes the development of the film “Forgotten Gods”, whose main scenario is the rock art sites of the Côa Valley. The script, following the symbolic suggestion by John Steinbeck in the novel “To a God Unknown”, proposes a renewal of the cult value of the Côa Valley through the superimposition of images and meanings. This renewal is not only done within the film: the filmic object itself can be seen as an engraving or, at least, as an ephemeral shadow that wanders through the lines made by the prehistoric man. The film was made under a protocol signed between the Côa Parque Foundation and the Faculty of Social and Human Sciences of Nova University. The film refers to several conceptual dimensions. We first explore the proximity relations between the cinematographic device and rock-art, regarding their technical aspects and forms of presentation, and what this implies in the relationship built with the viewer. In the context of projection mechanisms, of oneself and of the other, issues related to doubles, shadows, simulacra and statues are also explored - under the wing of the origin myths of painting and sculpture advanced by Pliny , the Elder, and Ficino. Other relevant issues concern the anachronistic relationship between men and the images of the past - whose temporal gap widens in the case of rock art - and the ability of the image to be projected into the present through the superimposition of meanings, to the programmatic use of music, “leitmotives”, to the choice of a capella female polyphony and the proposed relationships between voice, body and soul. Included here are the methodology and materials developed to carry out the project - script, storyboard, description of the shooting and musical recordings. Finally, a visual map is presented, proposing relations between the present project and artistic, cinematographic and, residually, literary production by leading authors, accompanied by some comments.