“Altos funcionários do Estado” e “príncipes da Igreja”: o episcopado na Monarquia Constitucional portuguesa (1820-1911)

Abstract

No período que mediou o primeiro pronunciamento liberal em Portugal (1820) e a Lei da Separação (1911), os bispos da Igreja Católica estiveram sujeitos a uma dupla vinculação: por um lado a integração no organograma do Estado e, por outro lado, a submissão a Roma. Se a primeira lhes dava o estatuto de altos funcionários com eventual acesso ao pariato por inerência do cargo a partir de 1826, o segundo dava-lhes o estatuto de agentes do internacionalismo católico, que tinha o Papa como figura máxima. Acusados com frequência, quer pelos meios católicos, quer por aqueles externos (partindo cada um do seu ponto de vista) de inadequação da sua ação às suas funções, eram também apresentados como estando desunidos, sendo incapazes de olhar para além da porção do território que lhes estava adscrita. A presente tese analisa algumas das coordenadas que esta dupla vinculação lhes estabelecia, realizando também um estudo prosopográfico sobre o conjunto dos indivíduos que foi titular de uma das dioceses de Portugal continental e ilhas adjacentes dentro do período assinalado. Descortina perfis de acesso ao cargo e outras tendências de conjunto. Debruça-se sobre o preenchimento da geografia episcopal e os seus desajustes e conflitos, quer em termos dos indivíduos, quer em termos do espaço, aqui sobretudo através do estudo do longo processo de reorganização diocesana que se concluiria em 1882. Estabelece também alguns vetores na transição da função episcopal em dois sentidos complementares: de um maior solipsismo para um entendimento de conjunto; da primazia da vinculação ao organograma estatal à da vinculação a Roma.

In the period between the first portuguese liberal revolution (1820) and the law of Separation of Church and State (1911), the catholic bishops were under a double binding: the integration on the States’ organizational chart and the submission towards Rome. The first one gave them the status of high officials, eventually with access to the upper house of the parliament, and the second one that of agents of Catholic internationalism, having the Pope as its highest figure. Frequently accused, both by catholics and non-catholics (each one from its own standpoint) of not being able to cope with the nature of their functions, they were also pictured as being deunited and unable to look beyond the portion of land assigned to them. This thesis analyzes some of the coordinates of this double binding, whilst developing a prosopographic study on the set of individuals who held a diocesis in mainland Portugal or its adjacent islands during the aforementioned period. It establishes profiles capable of accessing such position as well as some global tendencies. It also aproaches the filling of the episcopal geography, its maladjustments and conflicts, both in terms of individual and territories. In this second subject it focuses on the lenghty reorganization proccess of the diocesis, which was concluded in 1882. It defines some of the vectors that mark a transition on the episcopal function in two complementary ways: from a solipsist view to a group view; from the primate of the binding to the States’ organizational chart to the primacy of the binding towards Rome.